QUADRINISTAS

Felipe Nunes: Klaus

Klaus é um dos lançamentos mais interessantes desse ano. É uma HQ comprida para os padrões brasileiros: tem mais de 100 páginas. E as 100 páginas trazem uma história só, concisa, de um autor seguro em técnica narrativa e no desenho. É a recém o segundo trabalho solo de Felipe Nunes, que tem 19 anos (o primeiro foi Orome). Quantas HQs de 100 páginas você já tinha feito aos 19 anos?

Convidei o Nunes para escrever sobre a produção de Klaus. E estou cada vez mais contente com os textos convidados aqui n’A Pilha. Acho que estão dando conta de um registro de como se faz quadrinhos no Brasil. A ideia principal é criar referências, troca de experiência, quem sabe inspiração entre quadrinistas. Mas também espero que o Nunes releia isto daqui a 5 ou 10 anos e perceba o quanto mudou. Ou que não mudou nada.

 

Pra começar, acho difícil falar sobre uma história que fiz. Não deveria, já que fui eu que fiz e ninguém melhor que eu (provavelmente) entende.

Klaus é uma história simples, sincera, sobre a passagem da adolescência pra vida adulta. Klaus é o único humano no lugar onde ele vive. Ele tem catorze anos e é cercado por cachorros, tartarugas, ovelhas e muitos outros bichinhos. Seus pais são um casal de tigres. Submisso, ele vai ao colégio por obrigação e tenta ser legal, mesmo que se encrenque o tempo todo. A rejeição é onipresente. O fato é que, pro garoto, ele é só um tigre com desvio de genes.

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Comecei a escrever Klaus no inicinho de 2013, mas a ideia me veio na volta de um vestibular, no fim do ano anterior. O último vestibular do ano. Na época, a maioria dos meus amigos tinha um ou dois anos a menos e não estavam nesse processo de estudar-pra-caramba-e-fazer-mil-provas. Perdi algumas festas, alguns passeios. Me senti diferente.

Ser diferente pra mim era meio normal. Sempre fui diferente dos colegas. Ou porque eu fazia quadrinhos, ou porque eu era o gordinho boboca, ou porque não ia no shopping no fim de semana. E esse ano dos vestibulares, 2012, tinha sido libertador. Fiz novos amigos, perdi uns vinte quilos e estava vivendo meu melhor momento até então. Foi um processo do qual eu só me dei conta quando acabou. No fim, o Klaus é uma história quase autobiográfica sobre esse momento, sobre passar a rebentação.

Mas eu não podia só contar uma história que todo mundo vive. Ela precisava de algo a mais. Eu precisava mostrar um lado mais fundo que nenhum leitor viveu: o de ser realmente único. Apesar de ser um tema muito explorado, procurei mostrar como a mudança pode ser dolorosa, misteriosa e veloz.

A narrativa é cronológica, justamente para forçar a passagem de tempo e tentar manter a atenção do leitor. Com 100 páginas, me assustei quando acabei a decupagem. Mas sempre procuro aliviar a leitura. Gosto de pouco texto em cada quadro, acho que a leitura fica menos atravancada. E não tem uma página ali que eu não tenha feito sorrindo.

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Em agosto de 2013, inscrevi a história no ProAc com ajuda do Guilherme, meu querido editor da Balão Editorial. O projeto não foi aprovado. Desde então, refiz as 15 primeiras páginas pelo menos umas três vezes. Nunca me agradava.

Quando esse ano começou, vim estudar em São Paulo e o Fábio Moon e o Gabriel Bá me convidaram pra trabalhar de assistente (eu já tinha passado por essa experiência por uma semana, dois anos antes). Aprendi demais indo ao estúdio todos os dias. Acho que posso dizer que tudo o que sei agora veio de lá. Desde dicas para melhorar a composição como meu treinamento intensivo de pincel, incentivado pelo Fábio, e o acesso a livros de artistas com quem eu nunca tive contato, como Jeff Smith e Frank Miller. Todas essas coisas foram moldando o Klaus a ser o que é.

Mas quase não mostrei a história pro Fábio e pro Gabriel. Só uma vez ou outra, um e outro quadro.

Sem dúvida, a coisa mais importante que aprendi nos últimos tempos, seja no trabalho ou na experiência com o Klaus, foi que quadrinista não pode ter preguiça. Se a história pede uma cena, um ângulo ou um jogo de palavras, o esforço deve vir em primeiro lugar. Vencer as barreiras que a gente mesmo impõe. E é o que venho tentando.

No total, levei sete meses para fazer as cem páginas. Foi cansativo, mas não pensei em desistir nenhuma vez. Depois de ter ficado um tempo sem fazer quadrinhos, só ilustrando e vivendo na gandaia, no dolce far niente, hoje não me imagino de outra forma. Não quero inventar a roda ou fazer um sucesso editorial, um gibi metafísico cheio de interpretações ou uma história de 300 páginas que não chega em lugar algum. Só quero contar uma boa história – independente do que vai ser.

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Preview de Klaus.

Compre Klaus na Balão Editorial.

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Resenha de Klaus no Sem Serifa.

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